Durante o Carnaval, tendem a aumentar a venda de bebidas alcoólicas, o comércio ambulante nas ruas e a catação de resíduos sólidos, atividades que estão entre as piores formas de trabalho infantil
No Carnaval, enquanto a festa acontece, os confetes e as serpentinas podem esconder algumas das piores formas de trabalho infantil, como a exploração sexual, o trabalho realizado nas ruas e logradouros públicos e a comercialização de bebidas alcóolicas e outras drogas ilícitas por crianças e adolescentes. Essas atividades os expõem à violência, às drogas, ao tráfico de pessoas, ao envolvimento em acidentes de trânsito e às intempéries climáticas, como sol forte e chuva.
Com essa preocupação, o Ministério Público do Trabalho (MPT), a Justiça do Trabalho (JT) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) promovem, durante as festividades do Carnaval, uma campanha nacional para informar, conscientizar e sensibilizar a sociedade sobre os direitos de crianças e adolescentes e os males do trabalho precoce.
A campanha tem como slogan “Trabalho infantil não desfila no Carnaval” e homenageia a diversidade cultural do Carnaval brasileiro, ressaltando os ritmos musicais presentes nas regiões do país. Além disso, a iniciativa foi construída em conjunto com a articulação do MPT no Rio de Janeiro e a Riotur, chamando a atenção para o fato de que as festividades de Carnaval não são apenas cenário para a alegria e diversão, mas também pano de fundo para violações de direitos e a exploração de crianças e adolescentes.
Para a coordenadora nacional da Coordenadoria Nacional de Combate ao Trabalho Infantil e de Promoção e Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes, Luísa Carvalho Rodrigues, a reversão na tendência histórica de diminuição no número de crianças e adolescentes em situações de trabalho infantil, que aumentou nos últimos anos e passou a vitimar 1,9 milhão de crianças e adolescentes, é um grave retrocesso. “Todas as iniciativas de prevenção e combate ao trabalho infantil precisam ser fortalecidas, entre elas as ações de conscientização e mobilização da sociedade, especialmente em momentos em que crianças e adolescentes estão mais sujeitas a sofrerem violações de seus direitos, como no Carnaval.”
Segundo o coordenador nacional do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem da Justiça do Trabalho, ministro Evandro Valadão, toda a sociedade brasileira precisa contribuir com o compromisso que o Brasil firmou perante o mundo de erradicar o trabalho infantil. “Os reflexos de nosso histórico de desigualdades trazem um legado degradante para milhões de crianças e adolescente, que se agravou com a pandemia que vivemos nos últimos anos”, disse. “Infelizmente recuamos alguns passos e vimos os dados de trabalho infantil aumentar no país e precisamos, como sociedade, buscar a erradicação dessa prática que lesa essa parcela da população que possui prioridade absoluta e precisa de proteção”, completou.
“O Carnaval cria enormes oportunidades para geração de emprego e renda, em especial no setor de serviços, que podem contribuir para a inclusão social. Entretanto, é preciso assegurar que nesse processo não ocorram violações dos direitos humanos e trabalhistas, como trabalho infantil. Durante as festas populares e grandes eventos, como o Carnaval, é comum ver crianças e adolescentes trabalhando em atividades insalubres, como vendedores ambulantes, catadores de latinhas e guardadores de carros, dessa forma expostas a abusos físicos e sexuais, e a acidentes. Esta entrada precoce no mercado de trabalho pode causar abandono escolar e não ter mais retorno”, disse Vinícius Pinheiro, diretor do Escritório da OIT para o Brasil.
Para a secretária-executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, Katerina Volcov, campanhas de sensibilização contra o trabalho infantil são necessárias durante todo o ano, principalmente, durante as efemérides tradicionais do Brasil como é o caso do Carnaval. “Nessa época, é comum vermos crianças e adolescentes vendendo uma série de produtos nas ruas, em embarcações e em blocos de Carnaval de rua. E nós sabemos que o trabalho infantil pode, infelizmente, causar mortes”, afirmou. Ela destacou que o Brasil registrou 24.909 casos de acidentes de trabalho e 466 mortes envolvendo menores de 18 anos de idade de 2011 a 2020, com uma média de 2,5 mil acidentes e 47 mortes por ano, segundo estudo da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), publicado em outubro de 2023, na Revista Brasileira de Saúde Ocupacional.
Iniciativa do MPT-RJ em parceria com a Riotur
No Rio de Janeiro, o Ministério Público do Trabalho – Procuradoria Regional do Trabalho da 1ª Região, em parceria com a Riotur, além de postagens nas redes sociais, prevê a divulgação da mensagem em faixas e estandartes na abertura de dois dias do desfile das escolas de samba na Sapucaí. Além disso, a campanha local vai alertar para outras formas de violência no trabalho, promovendo o trabalho decente e informando canais de denúncia para situações de violações de direitos de trabalhadores(as) no Carnaval.
A Procuradora do Trabalho Elisiane Santos, responsável pela campanha no Rio de Janeiro, afirma “é preciso estar atento para o fato de que por trás da alegria da festa, há milhares de pessoas trabalhando, em todo o país. Nesse cenário, situações de trabalho infantil se agravam e não podem ser naturalizadas, assim como nenhuma forma de violência contra trabalhadores deve ser admitida. A campanha pretende despertar esse olhar dos foliões para a proteção da infância, e a consciência dos próprios trabalhadores sobre seus direitos.”
Trabalho infantil
No Brasil, o trabalho é proibido para pessoas com idade inferior a 16 anos, sendo permitido após os 14 anos, apenas na qualidade de aprendiz, uma modalidade de trabalho protegida que agrega renda, qualificação profissional e escolarização. A legislação vigente estabelece que adolescentes com idade entre 16 e 18 anos podem trabalhar somente se não ficarem expostos a trabalho noturno, perigoso, insalubre ou àquele que traga algum prejuízo à sua formação moral e psíquica.
O estabelecimento de uma idade mínima para o trabalho está baseado no direito fundamental ao desenvolvimento pleno, saudável e digno de crianças e adolescentes, o que inclui a escolaridade obrigatória e a proteção à sua saúde física e mental e à sua segurança, de modo que possam ter respeitada a sua condição de pessoa em peculiar condição de desenvolvimento.
O trabalho infantil é uma grave violação a direitos humanos, impedindo que crianças e adolescentes possam desfrutar de uma infância e adolescência plenas e dos direitos que lhe são assegurados: ao lazer, à cultura, à saúde, à educação, à formação profissional e à convivência familiar e comunitária.
Os dados oficiais mais recentes divulgados pelo IBGE indicaram um aumento de quase 7% nos casos de trabalho infantil, atingindo 1,9 milhão de crianças e adolescentes no Brasil em 2022. Destes, 756 mil estão em atividades consideradas piores formas de trabalho infantil, pelos riscos e repercussões à saúde que apresentam.
As piores formas de trabalho infantil representam uma ameaça à saúde, à segurança e ao desenvolvimento físico, emocional e psicológico de crianças e adolescentes. Nessas situações, eles ficam expostos a: violência; atropelamentos e outros acidentes de trânsito; tráfico de pessoas; assédio e exploração sexual; consumo de drogas e doenças neurológicas e de pele.
Trabalho infantil não desfila no Carnaval. Proteja a infância. Denuncie! Disque 100 ou acesse www.mpt.mp.br. Uma campanha do MPT, da JT e da OIT.