Segundo Chaui a palavra mito vem do grego, mythos, e deriva de dois verbos: mytheyo (contar, narrar, falar alguma coisa para outros) e mytheo(conversar, contar, anunciar, nomear, designar) e é uma narrativa sobre a origem de algumas coisas (origem dos astros, da Terra, dos homens, dos elementos naturais, da saúde, da doença, da morte, etc.).
Mas no transcorrer da história do homem podemos ver que ele sempre esteve ligado ao mágico e ao mítico e, assim, o ser humano conta histórias de heróis, sagas e cosmologia para lidar com o desconhecido e através de sua narração organizar seu contexto, constituir sua identidade, ter um entendimento dos processos da natureza, de sua origem e da origem do lugar em que vive, enfim, as narrativas mitológicas desempenhavam o papel de ordenar a existência. Podemos entender então que o papel do mito é o de orientar a vida, de indicar valores e ser a expressão de imagens subjetivas do ser humano tanto individualmente quanto coletivamente. O mito, dessa forma, acaba por expressar uma visão tanto do mundo pessoal como do mundo social. O mito é uma história que é contada numa linguagem metafórica onde o ser humano conta uma história inventada para si mesmo de modo que o mito é uma maneira de perceber os mundos interior e exterior.
Na antiguidade, antes do nascimento da Filosofia, o mito era um discurso pronunciado aos ouvintes por um poeta-rapsodo, pois acreditava-se que o poeta era um escolhido dos deuses, e a narração era tida uma verdade dita por uma autoridade e, portanto, o Ito era tido como sagrado, como uma revelação divina e, por conseqüência, incontestável e inquestionável. Dessa forma, os mitos direcionavam tanto a cultura quanto a religião. Mas, indo além do aspecto histórico do mito, podemos entender o mito como uma narrativa metafórica e não de fatos e que, segundo Campbell, atende a quatro funções:
- Despertar na mente um senso de deslumbramento do homem e do mundo;
- Apresentar uma imagem ordenada do cosmos;
- Validar e apoiar uma ordem moral específica, ou seja, as mitologias atendem o campo de determinada cultura e são expressadas através da linguagem e dos símbolos daquela cultura; e
- Ajudar as pessoas a compreender o desenrolar da vida em seus vários estágios.
Ainda segundo Campbell, os mitos “transmitem mais do que um mero conceito intelectual, pois, pelo seu caráter interior, eles proporcionam um sentido de participação real na percepção da transcendência”. Podemos entender então, o mito, como uma narrativa metafórica que contem símbolos que transmitem idéias e não fatos. Mitos são estímulos simbólicos para a percepção de idéias e do desconhecido.
A validade e valor do mito são contestadas quando o mito é tido como uma narração de “fatos” e não de “idéias”, ou seja, o mito passa a denotar e não a conotar.
Na Grécia os primeiros filósofos passaram a criticar a mitologia de Homero porque os deuses tinham muita semelhança com os homens e eles diziam que talvez os deuses não passassem de frutos da imaginação do homem. Os filósofos gregos da época queriam encontrar explicações naturais para tudo e sem recorrer à tradição dos mitos. Houve a transformação do modo de pensar: o pensamento atrelado ao mito passou a ser substituído pelo pensamento construído sobre a experiência e a razão. A Filosofia surgia como o conhecimento racional da realidade natural e cultural, das coisas e dos seres humanos. A Filosofia afirma que a verdade é racional.
Sendo o tema agora a “razão” cabe dizer que esta palavra origina-se de duas fontes: da palavra latina ratio que vem do verbo reor e que quer dizer contar, reunir, juntar, medir, calcular; e da palavra grega logos que vem do verbo legein que também quer dizer contar, reunir, juntar calcular. Dessa forma, segundo Chauí, “razão” significa “pensar e falar ordenadamente, com medida e proporção, com clareza e de modo compreensível para outros”. Assim razão pode ser entendida como a capacidade intelectual para pensar e expressar-se correta e claramente e dizer as coisas como elas realmente são. Assim, para a Filosofia, a razão opera seguindo certos princípios que são os seguintes:
- Princípio da identidade: qualquer coisa só pode ser conhecida e pensada se for percebida e conservada a sua identidade. Exemplo: o triângulo foi definido como uma figura de três lados e três ângulos internos então nenhuma outra figura poderá ser chamada de triângulo a não ser esta;
- Princípio da não-contradição: afirma que é impossível uma coisa ser e não ser ao mesmo tempo e na mesma relação, ou seja, não é possível se afirmar e negar a mesma coisa ao mesmo tempo. Exemplo: se estamos diante de uma árvore aquela árvore será árvore ao mesmo tempo, ela não poderá ser uma árvore e um cachorro ao mesmo tempo. A relação neste princípio comporta a transformação das coisas, por exemplo: uma criança é uma criança ao mesmo tempo, porém com o passar do tempo aquela criança se tornará um adulto e então será um adulto que é um adulto ao mesmo tempo;
- Princípio do terceiro excluído: enuncia que não há uma terceira possibilidade, ou seja, entre várias escolhas possíveis, só há realmente duas escolhas: ou certa ou errada; e
- Princípio da razão suficiente: afirma que tudo o que existe e tudo o que acontece tem uma causa ou motivo para existir e para acontecer e que tal causa ou motivo pode ser conhecida pela nossa razão. Neste princípio não é descartado o acaso e os fatos acidentais, mas cabe a razão procurar as causas do acaso e dos fatos acidentais.
A Filosofia coloca que existem duas modalidades de atividade racional: a intuitiva (ou razão intuitiva) onde a intuição faz com que tenhamos uma visão direta e imediata do objeto do conhecimento e sem necessidade de provas ou demonstrações para saber o que conhece; e raciocínio (ou razão discursiva) onde se chega ao objeto do conhecimento passando por etapas sucessivas de conhecimento para se chegar ao seu conceito ou definição.
Assim podemos entender a razão como a faculdade humana de estabelecer relações lógicas para conhecer e compreender qualquer coisa.